CONCLUSÃO

EuroPROFEM - The European Men Profeminist Network http://www.europrofem.org 

 

Précédente ] Accueil ] Remonter ]

CONCLUSÃO

Como socióloga que estuda o género e como americanista, optei pela análise deste best-seller que é Iron John: A Book About Men por duas razões: primeiro porque me permitia analisar a masculinidade heterossexual, tema pouco ou nada explorado em Portugal; segundo, porque sentia-me atraída pela figura de Robert Bly. Gostava de saber o que movia uma pessoa a defender uma forma de ser e estar (a masculinidade hegemónica) num momento em que o ser politicamente correcto e a discriminação pela positiva parecem inviabilizar tal defesa. Mas para além disso, interessava-me saber quais os mecanismos que Robert Bly havia lançado mão para pôr em prática o seu argumento.

Nesse sentido, a análise a este livro e aos artigos compilados foram muito úteis pois tive a possibilidade de confrontar Bly com a sociedade americana. E a leitura de autores como Robert Connell, Michael Schwalbe e Michael Kimmell foram de grande valia já que me forneceram o background necessário para enquadrar autor e obra no men’s movement.

No entanto, o facto de este ser um mestrado na área dos estudos culturais, logo interdisciplinar, revelou-se igualmente importante para a compreensão deste fenómeno, de uma forma mais completa e abrangente, visto que assim pude recorrer à antropologia, à sociologia do género e das religiões, à história e à psicologia, a fim de buscar elementos explicativos.

Desta forma, a resposta ao meu objectivo central é a seguinte:

Por reacção, expressa, ao feminismo e, oculta, ao movimento gay, um grupo masculino claramente definido como branco, classe média e heterossexual, do qual muitos membros haviam participado de forma activa no movimento feminista da década de 1960, nos anos 70 começou a sentir-se oprimido e a tomar consciência de que estava a perder poder, logo a hegemonia. Estes factos são, ao mesmo tempo, reforçados por uma alteração nas forças sócio-económicas.

A entrada maciça das mulheres no mercado de trabalho, principalmente em postos chave, e a divulgação de uma ideologia de contestação do patriarcado e dos valores masculinos, em parte sustentada pela forma de pensar NewAge, confronta-os com a questão: será o século XXI o século das mulheres e dos valores femininos? Um discurso como plenamente divulgado nos Estados Unidos, que tem igualmente sido responsável pelo ressurgimento dos valores puritanos, em muitos casos contrários a esta onda de feminização do modelo de pessoa.

Este panorama sócio-político, económico e ideológico desembocou no backlash contra as mulheres e o feminismo. Assim sendo, Robert Bly tem como objectivo principal criar e difundir uma imagem tradicional da masculinidade de uma nova forma, que camufle os seus verdadeiros intentos.

Para tal recorre a um discurso do tipo generalista, descontextualizado e do senso comum. A visão do género como algo invisível, psicológico, mas biogeneticamente herdado dos nossos ancestrais é a prova de que o terreno onde Bly se move não é muito sólido. Principalmente se a isto juntarmos um anti-intelectualismo estratégico que encontra no individualismo e no New Age as suas fontes de inspiração. Michael Schwalbe afirma que

The mythopoetic men did not want to engage in sociopolitical analysis, lest this impede their pursuit of self-acceptance, self-knowledge, emotional authenticity, and communitas. The men did not want to argue about whose account of social reality was correct. they wanted to feel better about themselves as men, to learn more about the feelings and psychic energies that churned within them, to live richer and more complex emotional lives, and to experience the rare pleasure and mysterious power of communitas. (Schwalbe, Michael. 1996:242)

Na tentativa de desenvolver um argumento político que transforme o grupo dominante em vítima do sistema, do patriarcado, do capitalismo, em suma: da história, e consciente dos riscos de se defender tal grupo Robert Bly pura e simplesmente omite e transforma em natural, intrínseco ao ser hunmano, o carácter político das relações de género e procura propagar a ideia de que os homens e as mulheres serão pessoas mais felizes se reencontrarem a sua essência e se passarem a viver segundo esta essência.

O impacto de tal discurso, associado à imagem que se criou das workshops mitopoéticas, é de tal forma forte que em 1998 este tema continua, nos Estados Unidos, a ser um tema actual. Mas principalmente pela forma como Bly ataca as mulheres e o universo feminino e defende um modelo masculino socialmente indesejado. Daí que os aspectos relativos ao uso da mitologia e da psicologia fiquem para segundo plano, quando o objectivo é analisar Iron John.

Estou ciente da importância e do peso que representa para um grupo que, por séculos, tem comandado uma sociedade, tem ditado as leis, controlado a economia e é simbolicamente mais poderoso do que os demais grupos sociais - haja visto a existência da assimetria entre homens e mulheres - sofrer uma perda de poder (real e simbólica) como tem vindo a acontecer com o grupo masculino dominante.

É exactamente por perceber que ao nível das identidades de género uma alteração de forças pode ter repercuções distintas, que me dediquei a este estudo. É por isso que o tomo como ponto de partida para que em Portugal se comece a reflectir sobre a situação da nossa masculinidade hegemónica, já que à nossa maneira a sociedade portuguesa caminha para uma situação semelhante à americana.

O movimento americano de recuperação dos valores tradicionais, no qual se insere Robert Bly, longe de contribuir para que se atinja um ponto de equilíbrio, tem fomentado alguns confrontos, algumas vezes violentos, entre defensores destes valores e as forças mais liberais e reformistas. Assim, acredito que, se por um lado temos vindo a assistir a uma defesa dos valores femininos como os valores do século XXI, por outro lado o discurso oposto tem, por reacção, se difundido e conquistado mais adeptos em ambos os sexos.

No entanto, acredito que o men’s movement trouxe grandes contributos aos homens. Antes de mais motivou o aparecimento dos men’s studies e, depois fez com que distintos grupos masculinos se unissem e lutassem pelos seus direitos. De certa forma trouxe a muitos homens a consciência de classe social que antes não tinham.

Contudo, e para concluir, gostaria de referir que a solução para este problema da crise na hegemonia masculina poderá passar pela adopção de um modelo de masculinidade mais versátil, mais adaptado a uma situação de modernidade, um modelo mais reflexivo, que permita aos homens identificarem-se com um vasto número de valores (advindos tanto do mundo feminino como das masculinidades agora subalternas) sem destruir as suas identidades de grupo ou os seus sistemas de valores. Havendo, para tal, que incorporar uma capacidade crescente de relativizar a diferença. Porque se trata de uma construção fluida, que conjuga variados tipos de práticas, valores e atitudes num movimento estratégico que permite ao homem actuar de forma positiva em ambientes diversos e dinâmicos.

Bibliografia

Bibliografia Primária.

Bloostom, George: "Is there a Wild Man in your Life?" New Woman. Julho de 1990: 72-78.

Bly, Robert, Iron John: A Book About Men. (2ª ed.) New York: Vintage Books, 1992.

Bouchier, David. "The last big roundup for real men". The New York Times. 18 de Julho de 1995: 19.

Csikszentmihalyi, Mihaly. "Bring on the Hair Mentor." The New York Times Book Review. 9 de Dezembro de 1990: 15.

Dana, Jaqueline. "Explique-em como são os homens, se faz favor." Elle Portuguesa. Trad. Claudia Baptista. Setembro de 1992: 42-5.

Doubiago, Sharon, "Enemy of the Mother: a Feminist Response to the Men's Movement", Ms., vol. 2. Março de 1992: 82-5.

Estés, Clarissa Pinkola. Women Who Run with Wolves: myths and stories of the wild woman. 2ª edição. London: Rider, 1993.

Figueiredo, Martim Avillez. "Who’s the boss?" Elle Portuguesa. Outubro de 1997: 30.

Gabriel, Trip. "At Home-Away-From-Home With: Robert Bly, now banging the drum slowly", The New York Times, 16 de Março de 1996: 1.

Gaines, Charles, "Robert Bly, Wild Thing", Esquire, vol. 116, (Outubro de 1991): 124-8.

Jenkins, Tony. "Ai! Os homens." Expresso Revista, 24 de Fevereiro de 1996: 39-59.

Johnson, Jill. "Why Iron John is no gift to women." The New York Times Book Review. 23 de Fevereiro de 1992: 23-31.

Kakutani, Michiko. "Beiond Iron John? How About Iron Jane?" The New York Times Critic's notebook, 23 de Agosto de 1993.

Keen, Sam. Fire in the belly – on being a man. London: Judy Piatkus Publishers Ltd., 1992.

Keillor, Garrison, The Book of Guys, Penguin Books, New York, 1993.

Lawson, Mark, "The Wild Man Mystique", World Press Review. 38 de Dezembro de 1991: 40.

Levine, Art. "Masculinities Champion." US News & World Report, Vol. 110, 8 de Abril de 1991: 61-62.

Martin, Rick. "What’s the problem? He won’t say". The New York Times, 7 de Novembro de 1992: 15

Milne, Kirsty. "Every Day is Mother's Day." New Statesman and Society, vol. 6, 19 de Março de 1993: 14-16.

Morrow, Lance. "The child is father of the man." The New York Times, 19 de Agosto de 1991: 52-4.

Myers, George, Jr., "Iron John: an interview with Robert Bly", Literary Review, vol. 35. Primavera de 1992: 408-14.

Rich, Frank. "Thank's god I'm a Man!" The New York Times. 25 de Setembro de 1996: 21.

Rubistein, Carin. "Parent and child, new advice on how to raise little boys to be a good men." The New York Times, 11 de Agosto de 1994: 1.

Shewey, Dom, "Town Meeting in the Hearts of Men", Village Voice, vol. 37, 11 de Fevereiro de 1992: 36-46.

Shweder, Richard. "What do men want? A reading list for the male identity crisis". The New York Times. 9 de Janeiro de 1994: 3.

Steinem, Gloria. Revolution from Within - a book of self-esteem. Berkshire: Bloomsbury Publishing Ltd, 1992.

Simon, Barry, "Iron John: a book about men, by Robert Bly", Archives of Sexual Behavior, vol. 23, Aug. 1994: 481-86.

S/ autor. "The trouble with men - tomorrow’s second sex." The Economist, 28 de Setembro de 1996: 23-32.

Vienne, Veronique. "Iron John: A lover's tate". Mother Jones, Vol. 18, Março de 1993: 26-33.

Williamson, Marianne. A Woman's Worht. New York: Random House, 1993.

Bibliografia Secundária

Almeida, Miguel Vale de. Senhores de si: uma interpretação antropológica da masculinidade. Lisboa: Fim de Século Edições, 1995.

Amâncio, Lígia. "Género: representações e identidades", Sociologia - Problemas e práticas. 14, 1993: 127-40.

-------- Masculino e feminino: a construção social da diferença. Porto: Edições Afrontamento, 1994.

Badinter, Elisabeth. XY - A identidade masculina. Trad. Luis de Barros. Porto: Edições Asa, 1993.

Bettelheim, Bruno. A psicanálise dos contos de fadas. Trad.Carlos Humberto da Silva. 5ª edição. Lisboa: Livraria Bertrand, 1995.

Bourdieu, Pierre. "La Domination Masculine", Actes de la Recherche en Sciences Sociales, vol.84, 1990: 2-31.

Brandes, S. "Like Wounded Stags: Male Sexual Ideology in an Andalusian Town", Ortner, S. e Whitehead, H., orgs., Sexual Meanings: The cultural construction of Gender and Sexuality. Cambridge: Cambridge University Press, 1981: 216-39.

Bravo, R. Sierra. Técnicas de investigación social: teoria y ejercicios. Madrid: Editorial Paraninfo, 1989.

Caplan, P. org.. The Cultural Construction of Sexuality. Londres: Routledge, 1987.

Carrigan, T., Connell, R., e Lee, J.. "Toward a New Sociology of Masculinity", Theory and Society. vol. 14, nº 5, 1985: 551-604.

Comte, Fernand. Las grandes figuras mitológicas, los dioses, los héroes legendarios y los mitos de las grandes civilizaciones antiguas. Madrid: Ediciones del Prado, 1994.

Connell, Robert. Gender and Power: Society, the Person, and Sexual Politics. Standford: Standford University Press, 1987.

---------- Masculinities. Oxford: Blackwell Publishers, 1995.

---------- & Lee, "Toward a New Sociology of Masculinity", Theory and Society 14, 1985: 551-604.

Cornwall, Andrea & Nancy Lindisfarne (org.). Dislocating masculine - comparative ethnographies. New York: Routledge.

Driessen, H., "Male Sociability and Rituals of Masculinity in Rural Andalusia", Antrophology Quarterly, vol.56, nº3, 1983: 125-33.

Faludi, Susan. Backlash - the undecklared war against woman. London: Vintage, 1991.

Ferguson, Marilyn. A conspiração aquariana: transformações pessoais e sociais nos anos 80. Trad. Carlos Evaristo M. Costa. 9ª Edição. Rio de Janeiro: Nova Era, Editora Record, 1980.

Foucault, Michael. História da sexualidade I - a vontade de saber. Trad. Pedro Tamen. Col. Antropos. Lisboa: Relógio d’Água. 1994.

Gennep, Arnold Van, The rites of passage. Chicago: The University of Chicago Press, 1960.

Gibaldi, Joseph. MLA handbook for writers of research papers. (4ª ed.) New York: The modern Lnguage Assotiation of America, 1995.

Giddens, Anthony. As consequências da modenidade. Trad. Fernando Luis Machado e Maria Manuela Rocha. Oeiras: Celta Editora LDA, 1992.

-------- Modernidade e identidade pessoal. Trad. Miguel Vale de Almeida. Oeiras: Celta Editora LDA, 1994

-------- Transformações da intimidade: sexualidade, amor e erotismo nas sociedades modernas. Trad. Rosa Maria Perez. Oeiras: Celta Editora LDA, 1995.

Gilmore, David. Manhood and the Making: Cultural Concepts of Masculinity, New Haven: Yale University Press, 1990.

Godelier, Maurice. La production de Grands Hommes. Paris: Fayard, 1982.

Heelas, Paul. The New Age movement. Oxford: Blackwell Publishers, 1996.

Jung, C. G.. O eu e o inconsciente. Col. Obras completas de C. G. Jung, vol. VII/2. Petrópolis: Vozes, 1979.

------ Psicologia do inconsciente. Col. Obras completas de C. G. Jung, vol. VII/1. Petrópolis: Vozes, 1980.

----- Psicologia e religião. Trad. Pe Dom Mateus Ramalho Rocha. Col. Obras completas de C. G. Jung, vol. XI/1. Petrópolis: Vozes, 1978

Kimmel, Michael & Michael Messner (org.). Men’s Lives. Boston: Allyn and Bacon, 1995.

Kyle, Richard. The New Age movement in American culture. Boston: University Press of America, 1995.

Levi-Strauss, Claude. Mito e significado. Trad. António Marques Bessa. Lisboa: Colecção Perspectivas do Homem, Edições 70, 1978.

Lutz, C. "Engendered Emotion: Gender, Power, and the Rhetoric of Emotional Control in American Discourse", Lutz, C. e Abu-Lughod, L., orgs., Language and the Politics of Emotion. Cambridge: Cambridge University Press, 1990: 69-91.

Murphy, M.. "Coming of Age in Seville: The Structuring of a Rites Passage to Manhood", Journal of Anthropological Research. nº 39, 1983: 376-92.

Ortner, S. & H. Whitehead. Sexual Meanings: the Cultural Construction of Gender and Sexuality. Cambrgidge: Cambridge University Press. 1981.

Pires, Maria Laura Bettencourt. Sociedade e cultura norte-americanas. 111, Lisboa: Universidade Aberta, 1996.

Rocher, Guy. Talcott Parsons e a sociologia americana. Trad. Olga Lopes da Cruz. Rio de Janeiro: Livraria Fransisco Alves Editora S.A., 1976.

The polity reader in gender studies. Cambridge: Polity Press, 1994.

Schwalbe, Michael. Unlocking the Iron John cage: the men’s movement, gender politics, and american culture. Oxford: Oxford University Press, 1996.

Seidler, V. "Reason, Desire and Male Sexuality", Caplan, P., org., The cultural construction of Sexuality, London: Routledge, 1987, 82-112.

Soczka, Luis. Ensaios de etologia social. Lisboa: Fim de Século Edições LDA, 1994.

Williams, Raymond. Culture. Cambridge: Gavin Mackenzie, 1981.

Vala, Jorge (org.) Psicologia social. Lisboa: Fundação Caloust Gulbenkian. 1993

 

 


Précédente ] Accueil ] Remonter ]